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não quero me gabar, mas enquanto geógrafa acho que tenho excelentes opiniões sobre qualquer questão territorial e cultural. você não concorda comigo? eu não ligo. tenho um diploma e a medíocre tradição científica ocidental ao meu lado. não é minha culpa que a modernidade legitimou que um pedaço de papel seja garantia de um pouquinho de autoridade pra alguém patético falar sobre alguma tema específico.
mas por pior que esse esclarecimento pareça, já fizeram barbaridades piores do que esse texto usando a mesma desculpa. então, nem venha encher o saco! boa leitura!
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rio grande do sul: continua sendo território brasileiro
acho que a gente não pode dar o gostinho pros gaúchos acabarem de absorver toda a cultura rioplatense. eles já possuem uma população com a autoestima excessivamente elevada. o luisito suaréz já está no grêmio, além de uma população considerável de colonos e eventuais foragidos/desertores da segunda guerra mundial. mas apesar de todo esse esforço, eles continuam usando uma erva-mate que se parece cocô de cavalo. um pó verde fininho e esquisito em uma cuia desnecessariamente grande e uma bombilla que fica entupindo toda hora. é um completo festival de erros em um disfarce cultural.
o chimas prejudica a reputação do mate e, consequentemente do povo guaraní. por isso, é imperdoável. eu genuinamente tenho raiva de constatar que os brasileiros em geral têm uma visão deturpada da erva-mate. mais de uma vez na vida levei de presente mate de verdade e as pessoas reagem com um desdém INJUSTIFICADO para um mate autêntico — além de achar muito amargo. gente? a erva mate tem que ser seca de verdade e cheia de palitinhos!!!! por essa única razão, todo o estado do rio grande do sul merece continuar sucumbindo ao expansionismo brasileiro, fruto de toda uma herança colonial portuguesa.
desculpe se sou muito cruel, mas a infelicidade dos sul-rio-grandenses em continuar sendo brasileiros é minha absoluta e genuína alegria.
santa catarina: negociável
poderíamos ganhar muito com um escambo de territórios, especialmente com a argentina. por todo valor afetivo que de florianópolis possui no imaginário tropical dos farofeiros argentinos, acho que eles seriam mais gentis com as paisagens litorâneas do que os empreiteiros brasileiros. precisamos de gente que realmente goste de praia e não precise morar em um apartamento com área gourmet e blindex. a colonização dos argentinos ricos no uruguay é questionável, mas ao menos eles vivem em casinhas bonitinhas e bucólicas (acho que é um precedente melhor que os empreendimentos recentes em sc que tiraram o sol de uma faixa de praia inteira).
sem contar que o ricardo darín passaria a virada de ano de florianópolis: um grande upgrade pra região que geralmente recebe o neymar e o andré marques.
perderíamos a oktoberfest, que seria um livramento e nos faria uma sociedade melhor. a oktoberfest é um completo mico no sentido de ser uma alegoria de uma colonização que não existiu de forma massiva aqui, a dos pomeranos. as maiores tradições dos alemães que vieram no século xix? uma missa luterana, casamentos endogâmicos e técnicas de defumar embutidos. além de encerrar esse capítulo dessa enorme fanfic cultural, perderíamos muitos eleitores do bolsonaro e células neonazistas.
e seria educativo para os neonazistas e os eleitores do bolsonaro viver a caótica vida política argentina. essa gente não impressionaria ninguém em um país tão intenso em que até eleição universitária leva os estudantes da letras e da filosofia (!!!) a se matar de porrada dentro da universidade. a única coisa que esses fachos otários poderiam fazer é sofrer bullying de um sindicalista barrigudo peronista.
mas voltando ao tópico central: o que brasil ganharia em contrapartida? pra mim deveria ser um território na patagônia e algo no altiplano andino. zeraríamos o bingo de biomas. teríamos uma paisagem glacial e um lugar bom de verdade para fazer vinho, além de abraçar uma hermosa população que nos ensinaria a fazer locro e empanadas. apesar de constituírem dois territórios muito importantes para a geopolítica argentina, é um preço muito modesto pra os argentinos que têm um padrão estético litorâneo tão baixo, que se até as praias do espírito santo fossem cedidas, eles já estariam muito felizes.
paraná: não mereciam, mas continuam pertencendo ao brasil
tenho uma anedota familiar, ainda que distante, sobre o paraná. foi lá o primeiro lugar que os bisavós do meu pai chegaram na américa do sul. claramente dois super fodidos: um marceneiro alemão e uma agricultora que vivia numa colônia alemã no império russo. mesmo saindo de lugares horríveis, tendo que lidar com perseguição política, falta de alimentos, guerras, uma expectativa de vida em torno dos 35 anos e depois de uma viagem horrível de navio da alemanha até o brasil, eles odiaram o estado do paraná. e muito prontamente se mudaram pra entre ríos (argentina) se estabelecendo por lá, que posteriormente se tornou a terra natal do meu querido abuelo.
por isso, fica a questão: se nem os mais necessitados dos imigrantes gostaram de lá, por que eu gostaria?
e vou além: por que o restante do brasil tem que gostar também?
em geral, não tenho muita vontade de que o paraná seja nosso por motivos de falta de carisma. é um estado que pariu o sérgio moro, os curitibanos e a banda mais bonita da cidade. sem contar a aura de ser um grande puxadinho do interior paulistano. nem a dimensão esportiva ajuda: é no paraná que temos os mais tristes clubes de futebol de toda a federação e a arena da baixada, que é uma aberração arquitetônica. é um estádio que se parece a um mega atacarejão, que é basicamente um crime inadmissível no país do futebol.
no entanto, a futura guerra por água potável me faz pensar que é justificável manter a soberania brasileira naquele estado, apesar de ser um território amaldiçoado. as próximas gerações precisarão do aquífero guaraní, do rio paraná e dos diretórios do mst que produzam tecnologias para uma agricultura sem agrotóxicos e da sabedoria e bom senso das comunidades originárias. portanto, o estado do paraná fica, mas acredito que poderíamos fazer um movimento de reflorestamento irrestrito, privilegiando as comunidades tradicionais, povos originários e pequenos agricultores. a cidade de curitiba seria desativada e se tornaria um santuário para as capivaras, uma forma, ainda que modesta, de reparação a esses nobres animais. o fim da cidade de curitiba seria também o fim de uma das maiores chagas dos estudos urbanos brasileiros: a crença que curitiba é exemplo de um bom planejamento urbano.
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